sábado, 27 de fevereiro de 2010

Brás Cubas (1985)


Amigos, já faz um tempo – mais de uma semana, na verdade – que não escrevo nada aqui. A verdade é que andei meio distante do cinema, embora tenha visto filmes até bem interessantes, mas dos quais não me senti preparado para falar sobre. Procurando matar minha sede de filmes, fui à locadora e aluguei vários, aos quais posso acabar comentando futuramente, mas, por enquanto, gostaria de falar sobre a obra “Brás Cubas”, do diretor Julio Bressane, baseado no livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis que, curiosamente, assisti em outras circunstâncias.
Não me sinto preparado, na verdade, para redigir um texto analítico mais formal, ou mesmo de escrever sobre ele da maneira habitual. Não, amigos. Gostaria de, no entanto, começar de verdade essa postagem transcrevendo um pequeno trecho da obra “Truffaut/Hitchcock”, o famosíssimo livro que conta com uma série de entrevistas do francês François Truffaut com o inglês Alfred Hitchcock, em que ambos conversam sobre a adaptação de clássicos literários para o cinema:
“Truffaut- (...) Há um grande número de adaptações na sua obra, mas na maior parte das vezes se trata de uma literatura estritamente recreativa, de romances populares que o senhor remaneja ao seu modo até que se tornem filmes de Hitchcock. Entre as pessoas que o admiram, algumas desejariam que o senhor fizesse adaptações de obras importantes e ambiciosas, Crime e Castigo, de Dostoievski, por exemplo.
Hitchcock- Sim, mas eu jamais o faria porque Crime e Castigo é a obra de um outro, justamente. Fala-se frequentemente de cineastas que, em Hollywood, deformam a obra original. Minha intenção é não fazer isso nunca . Leio uma história apenas uma vez. Quando a ideia de base me convém, eu a adoto, esqueço completamente o livro e fabrico cinema. (...) O que não compreendo é que alguém se apodere realmente de uma obra, de um bom romance que o autor levou três, quatro anos para escrever que é toda a sua vida.(...)
Truffaut- Isso explica porque não rodará Crime e Castigo.
Hitchcock- Acrescento que, se rodasse Crime e Castigo, isso não seria bom de qualquer maneira.
Truffaut- Por quê?
Hitchcock- Se você toma um romance de Dostoievski, não apenas Crime e Castigo, não importa qual deles, há palavras demais lá dentro e todas têm uma função.
Truffaut- E por definição uma obra-prima é alguma coisa que encontrou sua forma perfeita, sua forma definitiva? (
Hitchcock- Exatamente. (...)
Pois bem. Assisti nesse fim de semana a adaptação citada no primeiro parágrafo desta postagem. Segue uma breve ilustração para entenderem o que eu vi:
Imaginem Machado de Assis caminhando na rua. Ambos estão tranqüilos, quase que em sintonia, a vida, seguindo o seu tedioso e repetitivo ritmo. O nosso Imortal não tem, naquele instante, absolutamente nada demais ocupando seus pensamentos, Machado apenas caminha em direção ao lugar que pretende ir, poderia ser muito bem a padaria, um restaurante, a casa de um amigo ou sua própria.

Mas ele não está só. A sua espreita, um vil Julio Bressane o acompanha, obsessiva e calmamente. Machado não imagina que ele exista, quanto mais que o biltre o segue, contudo o perigo está muito próximo, a poucos passos de cheira-lo no cangote. O escritor está próximo a um beco e o diretor, cuidadosamente, aperta os seus passos. Seu olhar denuncia uma fúria e uma tara quase idióticas e sua mão segura um pedaço de ferro.

De repente, já colado a Machado, Bressane, o bastardo, o acerta na cabeça com sua barra de ferro. Machado cai atordoado. Julio sabia que aquele lugar passa muito pouca gente e que, naquela tarde, todos estariam mais ligados em assistir ao jogo da seleção brasileira. O cineasta o segura pelas pernas e arrasta o homem para o beco. O que se vê então é de causar pesadelos aos mais fortes: Bressane arranca as calças de machado e começa a currá-lo. Machado está completamente aturdido com a pancada, quase inconsciente, mas sua expressão denuncia dor e desespero. De alguma maneira isso parece excitar ainda mais o calhorda. Ele penetra com cada vez mais força o pobre escritor, levanta-se, termina de ejacular na boca de um quase morto e abandona sua vítima com as calças arriadas. Parabéns, Bressane. Você cometeu um dos crimes mais perversos e mais desalmados em toda a história da cultura nacional.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Eric Idle - Life will get you in the end

Uma pequena reflexão carnavalesca para todos nós, os malditos vivos.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Chang Cheh - Em Memória



Se uma doença pulmonar não o tivesse levado há quase oito anos atrás Chang Cheh faria hoje 87 anos. Para celebrarmos essa data tão especial a todos nós, seus admiradores, segue uma filmografia selecionada, alguns dos ainda poucos filmes que vi do diretor que me causaram boas afetações:
Sangue de Heróis (The Heroic Ones, 1970)

Um rei mongol decide dar cabo de todos os seus maiores inimigos. Para tal reúne nove de seus generais, que trata como seus filhos. Mas a inveja irá causar males irreversíveis dentro da família. Apesar do filme ser principalmente do boa praça David Chiang, a melhor cena de ação é protagonizada por Ti Lung, que enfrenta praticamente um exército inteiro com uma lança enquanto tenta proteger o rei embriagado. Participação especial de um careca Bolo Yeung.

Duelo de Punhos (Duel of Fists, 1971) e Hong Kong – A Cidade do Crime (Angry Guest, 1972)
Essa dobradinha está longe de ser uma unanimidade, mas tenho bastante apreço por ela.  No primeiro filme David Chiang é um engenheiro cujo pai, um mestre de kung fu, confessa a beira da morte que teve um filho fora de seu casamento com uma tailandesa, e pede pra que ele encontre. Mas eles não sabem que o outro filho é Ti Lung, um talento dos ringues de Muay Thai que se encontra em sérios problemas com bandidos que exigem que ele entregue uma luta. As cenas de boxe tailandês que percorrem o primeiro filme estão longe de serem perfeitas, mas achei um filme divertido e é simplesmente um barato ver o David Chiang usando as roupas da moda dos anos 70 passeando por Bangkok. Em certos momentos, por algum motivo, me lembra o filme que o Roberto Carlos não fez. 
No segundo a coisa melhora, os irmãos se envolvem com a Yakuza e precisam derrotar os cruéis bandidos, liderados pelo próprio diretor Chang Cheh e contando com o exímio carateca Yasuaki Kurata como braço direito. Longe do clima trágico e solene de seus outros filmes, essa dobradinha deve ser o cinema mais convencional e pop do diretor, que mostra bastante talento.
O Assassino de Shantung (The Boxer From Shantung, 1972)
Chen Kuan Tai é um pobre rapaz que chega a Shanghai em busca de oportunidades e consegue alcançar fama e fortuna com a única coisa que possui: os punhos. Além das cenas de ação muito bem encenadas, em especial a brutal sequencia final, o filme ainda retrata de maneira sensível a exclusão, sem cair em sociologismos tolos e perder a aura trágica e heróica que sempre acompanha a filmografia do diretor. Vale fazer uma dobradinha com “O Guerreiro de Aço” (Man of Iron), uma ótima “continuação” do filme passada vinte anos depois com o mesmo astro principal.
Irmãos de Sangue (Blood Brothers, 1973)
Chang (David Chiang) e Huang (Chen Kuan Tai) são dois irmãos ladrões que se unem com Ma (Ti Lung) em sua jornada em busca de glória. Mas a paixão entre o ambicioso Ma e a esposa de Huang irá trazer sérios problemas a irmandade. A busca pela fortuna sobrepujando a união sempre terminou mal no cinema do diretor. Filme recomendado para quem gosta do filme “Bala na Cabeça”, de John Woo, um “Changuista” ferrenho.
O Grande Mestre da Morte (Grande Master of Death AKA New Shaolin Boxers, 1976)
Alexander Fu Sheng é um jovem com talento no kung fu e um forte senso de justiça que compra briga com bandidos que oprimem os moradores da cidadezinha que mora. Esse me surpreendeu, a trama é bastante lugar comum no gênero, parece um filme do começo dos anos 70, mas acaba transcendendo. Um filme mais belo e trágico do que esperava. Recomendadíssimo.
Os Cinco Venenos de Shaolin (Five Venoms, 1978)
Um moribundo mestre de kung fu treina cinco discípulos em diferentes técnicas mortais. Porém, receoso de que alguns deles possam usar o que aprendeu para o mal, envia seu sexto discípulo em uma busca para impedir que os vilões triunfem, sendo necessário que este se una aos lutadores honestos. Mas têm um detalhe: todos os alunos treinavam usando máscaras, de maneira que não se sabe quem são os bons e os maus. O “whodunnit” de Chang Che pode não ser o maior filme de mistério já filmado, mas o diretor equilibra o drama e a ação com sua competência habitual, além de ter revelado ao mundo o grupo de atores que passaram a ser conhecidos como Venoms, como o excelentíssimo Kuo Choi AKA Philip Kwok, o pistoleiro sem um olho de “Fervura Máxima”.
Combate Mortal (Crippled Avengers, 1978)
Um cego, um surdo-mudo, um homem sem pernas e um louco se unem para enfrentar um terrível tirano e seu filho, um assassino que não têm as mãos. Não preciso dizer mais nada.
2 Campeões de Shaolin (Two Champions of Shaolin, 1979)
Esse é sensacional. Shaolin e Wu Tang envolvidos em ideologias políticas diametralmente opostas se enfrentam, numa guerra que não vai poupar ninguém. O final deste filme chega quase ao niilismo e tem alguns dos melhores combates de todos os tempos. Mais uma parceria do diretor com os Venoms, com o “Sapo” Lo Meng como astro principal.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Ninja Assassino (Ninja Assassin - 2009)

 
Amigos, essa postagem deveria ter sido feita dias antes, mas antes tarde que mais tarde ainda O ano de 2009 foi cercado de certa expectativa para todos os entusiastas dos filmes de ninja: os irmãos Wachowski com sua produção "Ninja Assassino" (Ninja Assassin) e Isaac Florentine com "Ninja" (Idem). Enquanto o primeiro contava com a direção de James McTiegue- seja isso bom ou ruim, não vi "V de Vingança"-, um popular astro pop coreano (o que é quase garantia de porcaria) e com as cenas de ação coordenadas pela equipe 87 Eleven, considerada uma das melhores do mercado, além de milhões de dólares, o que os permitiu realizar parte do filme em Berlim, o segundo contava com Scott Adkins no papel principal, coreografia feita por Akihiro Noguchi, responsável pela ação do filme "O Faixa-Preta", e tiveram de filmar na Bulgária fingindo estarem em Nova York. Resultado Final? Dinheiro não compra qualidade...

Enquanto o primeiro filme contou até com J. Michal Straczynski  como roteirista e com a produção da dupla que "revolucionou" o cinema de ação hollywoodiano, além de terem exposto o astro principal, de nome Rain, a uma severa rotina de atividades físicas que permitiram que o ator enganasse muito bem nas cenas de luta, com uma veracidade raramente atingida por atores sem formação marcial. Porém, o filme foi em boa parte estragado pela falta de habilidade de McTiegue, que com sua câmera tremida arruinou meses de muito trabalho. Cacete, pra quê o esforço em ter os melhores do mercado e filmar tudo como se tivesse que esconder limitações na gravação? Nem Sam Firstenberg faria isso! O filme no geral não é ruim, a história, mesmo clichê e com furos de lógica, tem um clima mais "quadrinho" do que várias adaptações pra cinema e é um passatempo com bastante ação, participação do honorável  Shô Kosugi como o mestre do mal, e um bocado de sangue, embora em um óbvio CG. Aliás, os efeitos visuais deixam muito a desejar, principalmente se levarmos em conta que os envolvidos no filme realizaram "Matrix".

Outro destaque, não sei se positivo ou negativo, é a falta de expressão do ator principal. Quando assisti ao American Ninja 4, episódio que reúne Michael Dudikoff e David Bradley, finalmente percebi que menos é mais quando se atua em um filme de ação. Quero dizer, se o ator prefere usar a mesma cara do começo ao fim do filme ele irá convencer mais do que se tentar expressar mais de uma expressão. Dudikoff provou que mesmo sendo incrivelmente pior que Bradley nas cenas de ação, ele parece mais durão. O mesmo podemos dizer de Rain: sua atuação no melhor estilo Jean Claude Van Damme combinado a uma voz mais empostada, mais grave, o tornam mais parecido com um guerreiro que Adkins em Ninja, embora o segundo varresse o chão com o primeiro. Claro que ser oriental faz qualquer um convencer mais como um ninja, mas não vou entrar nesses méritos.

No fim das contas, Isaac Florentine e Adkins são uma dupla muito mais poderosa que quaisquer "visionários" de Hollywood quando estes decidem fazer ação. "Ninja Assassino" é a prova de que a década passada desaprendeu a fazer filmes de luta. Divertido, mas poderia ter sido bem melhor.

Isaac Florentine e Scott Adkins: a resposta ocidental a Wilson Yip e Donnie Yen

Quem quiser conferir o making off do "Ninja Assassino", clique aqui. É mais interessante do que algumas partes do filme. Podem também conferir os textos do Ronald e Osvaldo sobre o filme do Adkins.

Zooey Deschanel & Joseph Gordon Levitt - Why do you let me stay here?

Dirigido por Marc Webb de, bom, vocês sabem.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

George Romero faz 70 anos

George Andrew Romero faz hoje 70 anos de idade e, para comemorar, recomendo assistirem um dos maiores clássicos de terror de todos os tempos. Bom, ao menos dos meus tempos.
O gente boa Jason Flemyng num papel interessantíssimo de um homem que precisa perder sua própria face para recuperar a si mesmo. Mais do que uma história de morte e vingança,  uma afirmação da individualidade do homem e da importância de ser fiel a si mesmo. Conta ainda com a participação da banda The Misfits. Indicados a todos aqueles que acham que Romero só sabe fazer filmes de zumbis.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

“Eu costumava comer caras como você na prisão”


Enquanto visitava o blog do amigo Renzo Mora, em sua postagem sobre um livro americano sobre filmes ruins, deparei-me com a pequena citação, que titula este meu texto. Essa  que é apenas uma de várias outras pérolas da dramaturgia mundial, foi proferida por um dos malfeitores presentes no filme “Matador de Aluguel” (Road House, 1989), do diretor Rowdy Herrington. Produzido em uma época mágica onde os tiros sangravam, o casal principal fazia sexo, raramente se matavam menos de 50 pessoas e o  falecido Patrick Swayze se dividia entre bancar o homem dos sonhos das mulheres e defender oprimidos de malfeitores sodomitas.  É uma pequena gema que lida com a figura de um mártir (no caso Dalton, um leão-de-chácara) que ao se deparar com a perdição, anarquia e caos tenta fazer a diferença, trazendo a paz e a harmonia em um local que não parecem conhecer essas palavras . Mas no lugar de uma bíblia e uma palavra amiga, ele tinha seus pés e punhos. 
Dalton dissertando sobre o ensaio "A Utopia", de Thomas More
Um tema que se repete várias vezes na filmografia americana, mas poucas vezes de maneira tão poética. Embora muitos críticos fossem acusar o filme de imperialista, já que a violência é moralizada na história e em momento algum a figura dos oprimidos pelo cruel Brad Wesley (encarnado com primor por Ben Gazzara) se mostram tão vivos e capazes longe da presença de Dalton. É como um "Novo Cristo", voltando para salvar os oprimidos. Hão também de criticar que a figura da bela médica Elizabeth “Doc” Clay ( uma estonteante Kelly Lynch) só se faz presente para servir de vítima e de amante do herói,  o velho reducionismo da figura feminina. Provavelmente até mesmo belíssimas cenas como em que Dalton e seus colegas impedem um grupo de pit boys de entrarem sem estabelecimento sem ser por uma conversa tomando um chá ou quando Denise (o colosso Julie Michaels), namorada do vilão, dança sensualmente, culminando em um striptease, serão vistas como baixas, como símbolos de uma época decadente, porém superada na história do cinema americano.  Provavelmente o fato do protagonista ser um segurança de boates que REALMENTE prefere tentar uma certa dose de diplomacia antes de usar suas verdadeiras habilidades seria acusado de falta de realismo, como se isso importasse à trama.
Um herói e um amante - a síntese perfeita da carreira de Swayze nos anos 80

Mas não se iludam, leitores. É apenas a retratação da superação de si mesmo através da perseverança. Um filme sobre fazer o que é certo, é essa a questão posta em pauta pelo diretor. Como disse, pode ser um tema batido, mas não é a “originalidade” que importa, mas a condução, o que ele nos diz sobre nós mesmos. A ausência desse filme no Oscar do ano de seu lançamento e mesmo sua ausência mesmo nas mais respeitosas listas de “Melhores de Todos os Tempos” jamais será compreendida por mim. Mas tudo bem. Certas obras nasceram muitos anos mais cedo do que deveriam.
 Uma pequena demonstração da boa vontade de Dalton para com o próximo: